Um dos grandes diferenciais da obra de Markus Zusak, “A Menina que roubava Livros” (The Book Thief), surge logo nas páginas iniciais, quando nos deparamos com uma inusitada narradora: a Morte.
A partir daí, a adaptação cinematográfica chega com a difícil missão de transportar para as telonas uma Alemanha que vivia todo o horror imposto pela Segunda Guerra Mundial, e por ideias e ações execráveis dos que estavam no poder.
No centro dos acontecimentos está Liesel Meminger, que desde muito cedo teve que aprender que nem todos podem ter a felicidade ao alcance das mãos.
Com a mãe sendo perseguida pelos nazistas e a morte do irmão caçula, a garota é levada à casa de pais adotivos, que se propõem a cuidar dela em troca de pagamento. É em cima dessa condição, em meio a tantas desventuras, que ela terá que construir uma relação de cumplicidade e sabedoria mútua, e descobrirá sua paixão pela leitura.
Rudy, “um menino com cabelos da cor de limão”, Max, um jovem judeu que luta por sua sobrevivência, e Ilsa, “a mulher do prefeito”, completam o mundo de Liesel, e surgem como nomes fundamentais na formação de seu caráter.
É necessário ressaltar que o longa não é um documentário, e apesar de claramente terem existido várias histórias como a da pequena protagonista, ele não se baseia em fatos reais. Dito isto, não há razão para criticar a produção por seu teor menos aterrador do que o visto na obra original.
Não é necessário ver uma pilha de cadáveres, ou pedaços de pessoas estilhaçadas por bombas, para saber o quão cruel foi essa época. Não é preciso mostrar o rosto de um ditador para julgar seus atos e colocar em dúvida sua natureza humana.
Ou seja, dadas as devidas alterações, o livro foi adaptado com louvor. Se, assim como eu, outros leitores tremiam ao pensar em como a Morte seria retratada sem parecer bizarra aos olhos do público, a boa notícia é que tal ação foi realizada com sucesso. A sutileza da voz do veterano Roger Allam deu à personagem o tom ideal, e a decisão de diminuir sua participação – que é bem maior no livro – parece adequada.
Com um elenco bastante afinado e John Williams mais uma vez mostrando competência ao criar uma belíssima trilha sonora – que lhe rendeu a 49ª indicação ao Oscar – o filme cumpre seu papel de fazer os espectadores se questionarem se, realmente ainda é possível acreditar que a humanidade tem conserto. Particularmente, eu tenho minhas dúvidas.
por Angela Debellis