Crítica: “Passagens”

O humano é um ser complicado. E se as pessoas o são, muito mais as suas relações. Pode-se acrescentar que, quando nestes vínculos intervém o sexo, decididamente há complexidade. Um vasto número de fatores está envolvido para produzir este resultado.

O dito pode ser apenas um resumo anterior a assistir a um filme ou, também, uma consequência dele. Nesta oportunidade parece ser bem apropriado aplicar algumas dessas reflexões a “Passagens” (Passages).

Basicamente, é a história da relação homoafetiva de Tomas (Franz Rogowski, que há pouco tempo vimos como protagonista, também, em “Disco Boy”) e Martin (Ben Whishaw, em seu 31º longa-metragem). Tomas é um diretor de cinema de produções de baixo orçamento que, apesar disso, as encara de forma bastante tirânica (ou rigorosa, como se prefira entender). Por outra parte, o vínculo entre os dois personagens está em crise, com deterioro pronunciado.

Para piorar, Tomas conhece Agathe (Adèle Exarchopoulos), em uma festa. Esse encontro produz uma forte atração nela, que também está em uma relação insatisfatória, e “parte para cima dele”, derivando em um imediato encontro sexual. Tomas decide contar a seu parceiro que, inesperadamente, se sente atraído por uma mulher. O conflito entre eles se aprofunda de forma irremediável.

Novas situações, vínculos e oscilações se sucedem. Os sentimentos tomam conta de modo intenso, com permanentes idas e voltas. Se ao casal inicial (Tomas – Martin) se soma à presença de Agathe, depois aparecerá um quarto elemento, Amad (Erwan Kepoa Falé), relacionando-se com Martin. Assim, “Passagens”, título do filme, aponta que as mudanças nas relações são, também, transições na vida das pessoas.

Nesse relato, a fotografia, sob a responsabilidade da experiente Josée Deshaies, com cores bem trabalhadas e também em preto e branco, resulta bonita e importante. O filme não vacila em mostrar cenas de elevado conteúdo sexual. Logicamente não é um produto pornográfico, onde a explicitude é total e único objetivo. Embora as tomadas sejam fortes, estão cuidadosamente elaboradas, chegando até o limite do explícito.

É curioso perceber nessas cenas dois aspectos: as homossexuais têm maior densidade e evidência do que as heterossexuais, nas quais participam Tomas e Agathe. Nestas últimas, o corpo da mulher não é exposto em grau avançado. E, em algumas oportunidades, aparece o lado romântico e o amor parece ganhar terreno. Além disso, as falas dos personagens procuram refletir, justamente, sobre amor, paixão, desejo e liberdade.

De modo geral, “Passagens” tem muitos elementos que podem ser definidos como característicos de uma liberdade avançada nos vínculos pessoais e sexuais ou, até o contrário, como parte de neuroses problemáticas próprias de instabilidade. Sem dúvida defronta o espectador com suas próprias posturas e concepções sobre o amor, as diferentes manifestações da sexualidade e a vida em geral.

Ira Sachs, diretor – em seu 12º longa-metragem – e co-roteirista, elaborou um filme forte, com conotações que podem interessar positivamente parte do público, porém, simultaneamente, desagradar alguns espectadores. Tudo isso em uma realização que, como as relações que descreve, não é simples.

por Tomás Allen – especial para A Toupeira

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela O2 Play Filmes.

Filed in: Cinema

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