Crítica: “A Garota da Vez”

“A Garota da Vez” (Woman of the Hour) aborda um assunto conhecido, mas que não deixa de ser grave e socialmente preocupante. Trata-se já não apenas de abusos sexuais, mas de assassinatos de mulheres jovens por parte de um estuprador/criminoso em série. Isto é, segundo definição psiquiátrica, aquele que comete vários homicídios em período de tempo relativamente breve, neste caso específico motivado por uma compulsão psicológica.

Assim, produz uma carga emocional de indignação, certa impotência e até surpresa por existir sujeitos com tal perfil psicológico e atuar perverso. O personagem Rodney (o costarricense Daniel Zovatto) nesta produção cinematográfica tem essas características, além de ser, também, um sedutor bastante informado e até com certo grau de cultura.

A protagonista, Sheryl (Anna Kendrick nesse papel e, também, como diretora, em seu primeiro longa-metragem), é uma jovem que não consegue trabalhar em Hollywood e se sente fracassada. Para tentar sair de seu isolamento e superar a frustração e leve depressão, aceita o conselho de participar de um programa de televisão que facilita o encontro entre duas pessoas.

Quando ela faz parte desse programa e pode escolher entre três homens, opta pelo mais astuto/inteligente, justamente Rodney.  Porém, antes disso, na primeira sequência de cenas do filme, os espectadores já ficam sabendo que ele é um psicopata ou um possuidor uma personalidade antissocial (é sabido na psicopatologia que são indivíduos carentes de remorso, têm frieza; não são loucos, pois têm vínculos coerentes com o mundo).

Estamos diante de uma obra que nos antecipa não só quem é a personagem boa (obviamente, a protagonista) e quem é o malvado (o homem chamado Rodney), senão, também, como este último atua. Por isso, trata-se de um thriller, onde o espectador sabe quase tudo o que é fundamental (sobre mistério e suspense no cinema é praticamente obrigatório escutar e ler o mestre Alfred Hitchcock, diretor e analista irretocável).

Diferente ao terror, que procura gerar medos e sustos, este título deveria manter o espectador tenso, expectante por algo que não imaginou que poderia acontecer. Usando situações quase cotidianas, próprias “deste mundo” (definimos assim, em contraste com o sobrenatural, mais utilizado no terror), há uma trama policial, porém, o realmente interessante, é esse desafortunado encontro de condições psicológicas diferentes.

Em “A Garota da Vez”, isso aparece com Sheryl e outras mulheres, jovens, bonitas, inocentes no fundo, e o perfil de Rodney, habilidoso, astuto, com instabilidade mental, que deriva em atos absolutamente malignos. Inclusive, de modo até duplamente injustificado, porque conseguiria ter relações sexuais igualmente de outra maneira, por via da sedução.

Nesta obra, pode faltar a referida tensão, que só consegue em algumas sequências (por exemplo, uma perseguição em um estacionamento escuro e isolado). Setores do público, com certeza, acharão nobre uma implícita denúncia que há contra abusadores, estupradores, torturadores e assassinos. E há uma espécie de alerta para as mulheres não confiar em alguns homens (nota talvez marginal: Rodney mantém discussões com outro homem, concorrente, e com um terceiro, em modo ameaçador).

Outros elementos fundamentais que se consideram ao analisar um filme são a música (Dan Romer – que tem antecedentes, dentre os quais, “O Bastardo” – e Mike Tuccillo), a edição (Andy Canny, alternando o presente do personagem Rodney, com seu percurso criminoso dos anos anteriores), a fotografia (Zach Kuperstein), interessante ao mostrar tomadas com planos e ângulos que se assemelham aos do personagem Rodney em sua tarefa de fotógrafo.

Também as atuações, começando por Anna Kendrick, com boa alternância entre inocência e desconfiança. E continuando com Daniel Zovatto, com gestos e micro-gestos muito significativos, em especial nas sequências da primeira parte, porém produzindo redundância e certo cansaço à medida que o longa progride.

O fechamento se dá sem chegar a uma resolução impactante. Os créditos finais podem trazer alguma informação adicional que os espectadores definirão qual grau de importância tem. Por outra parte, haverá que aguardar próximos títulos com a direção de Anna Kendrick, para ter uma opinião mais fundamentada.

por Tomás Allen – especial para A Toupeira

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Diamond Films.

Filed in: Cinema

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