Crítica: “Aqui”

“Todos nós temos nossas máquinas do tempo. Algumas nos levam pra trás, são chamadas de memórias. Outras nos levam para frente, são chamadas sonhos”. A frase dita por Jeremy Irons no longa “A Máquina do Tempo” (2002)- adaptação do livro homônimo de H.G. Wells – faz um resumo preciso do que vemos em “Aqui” (Here).

Dirigido por Robert Zemeckis (que assina o roteiro junto a Eric Roth), o drama – assim como a graphic novel de Richard McGuire na qual se baseia, cuja ideia original foi publicada em uma revista independente, nos anos de 1980– mostra a passagem de vários anos através de uma única perspectiva: a sala de uma casa.

Contada de forma não-linear, a trama, embora simples, pode ser desafiadora àqueles acostumados a obras que seguem o padrão de exibir os acontecimentos conforme estes ocorrem – recorrendo a poucos ou a nenhum flashback.

O que não significa que a proposta seja inválida, pelo contrário. Quanto mais a narrativa se desenvolve, mais encantadora e envolvente se torna, por sem nenhum esforço, ser capaz de ativar memórias de vivência semelhantes na plateia.

A história gira em torno do casal formado por Richard (Tom Hanks) e Margaret (Robin Wright), passando por todas as fases de seu relacionamento: do início – quando ainda muito jovens descobrem uma gravidez inesperada e decidem se casar, passando pelos prazeres e dilemas da vida a dois, até chegar à fase final da trajetória de todos que têm a chance de viver muitos anos: a velhice – e todos os seus desdobramentos.

A dupla partilha o protagonismo com Al (Paul Bettany) e Rose (Kelly Reilley), pais de Richard, com quem dividirão a tal casa que serve como cenário para acolher inúmeros relatos, desde sua construção em 1900.

Mas, as ocorrências ofertadas à audiência começam muito antes do imóvel ser erguido. Vemos o que ocorria no terreno que lhe serviria de base, em épocas bem mais remotas – sequências que necessitam de um uso maior de CGI, até para conseguir representar criaturas em extinção.

Sob a belíssima fotografia de Don Burguess e a comovente trilha de Alan Silvestri, “Aqui” nos conduz a um passeio por várias décadas ricamente ilustradas através da mutação de cenografia, figurinos e personagens que, em comum, têm o fato de terem residido na mesma casa em algum momento.

Alegrias e decepções, êxitos e fracassos profissionais, ganhos e perdas emocionais. Promessas adiadas que nunca saíram do papel, carreiras deixadas de lado em prol da família, relações que permanecem, uniões que se desfazem. O eterno movimentar da vida, que nos compele a ir em frente, não importa o quanto isso nos custe.

Tudo isso é representado com uma delicadeza ímpar, proporcionando uma alternância de sentimentos que, acima de tudo, consegue encher o coração dos espectadores que se dispuserem a acompanhar essa jornada de idas e vindas do tempo, apenas para lembrar o real e mais importante motivo de cada um estar nesse mundo.

É provável que “Aqui” consiga atingir mais facilmente uma parcela de público que tenha familiaridade (seja por vivência própria ou por estudos a respeito) com pelo menos algumas das épocas reproduzidas em tela. A nostalgia é um grande catalisador de emoções e, nesse caso, um elemento fundamental para se deixar levar pela beleza e relevância da história.

Para ver, se emocionar e refletir.

por Angela Debellis

*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Imagem Filmes.

Filed in: Cinema

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