Quando pensamos na franquia “Capitão América” dentro do Universo Cinematográfico Marvel (UCM), logo nos vem à mente um enredo imerso em intriga política, espionagem e conspirações.
A saga, que sempre se destacou por abordar temas como corrupção, abuso de autoridade e o poder das instituições públicas, foi responsável por nos entregar uma das mais sofisticadas e envolventes narrativas do gênero de super-heróis com “Capitão América e o Soldado Invernal” (2014). Considerado um dos melhores filmes do UCM, o longa se destacou pela combinação de um roteiro afiado e uma direção precisa, elevando o filme a um patamar mais sério e reflexivo, onde o heroísmo coexistia com dilemas morais e geopolíticos.
No entanto, mais de uma década se passou desde a estreia de “Capitão América 2”, e o UCM hoje navega por águas mais turbulentas, mergulhando em tramas multiversais que se distanciam das histórias mais intimistas e políticas que caracterizavam a franquia. Em um cenário tão distinto, “Capitão América: Admirável Mundo Novo” (Captain America: Brave New World) se arrisca a retornar a essas raízes, tentando resgatar a mesma essência de espionagem e dilemas globais que fizeram sucesso no passado.
Sam Wilson (Anthony Mackie), agora o novo Capitão América, tem a árdua tarefa de honrar o legado deixado por Steve Rogers (Chris Evans). O mundo, marcado pelo Blip e pela introdução da misteriosa Ilha Celestial, se vê em uma corrida global para extrair Adamantium, um novo minério que promete ser mais poderoso e versátil que o Vibranium.
O protagonista se encontra, então, em um jogo político de proporções globais, onde o Presidente Tadeu Thunderbolt Ross (Harrison Ford) — com um histórico de envolvimento com o Hulk e sua caça aos meta-humanos — pode ser tanto aliado, quanto ameaça.
O enredo, à primeira vista, parece promissor, especialmente pela presença do General Ross, um personagem já bem explorado em “Capitão América: Guerra Civil” (2016). Harrison Ford, lendário, entrega uma interpretação sólida do Presidente, equilibrando a frieza política com os ecos de seu passado militar explosivo e as tensões internas de seu alter ego monstruoso “Hulk Vermelho”.
Sua performance é uma das grandes qualidades do filme, e sua habilidade em capturar a dualidade de Ross como um homem em constante controle de sua própria natureza destrutiva é admirável. No entanto, fica a sensação de que o personagem poderia ter sido mais explorado nos últimos anos do UCM.
Por outro lado, a atuação de Anthony Mackie, que brilhou como Sam Wilson tanto em “Capitão América: Guerra Civil” quanto na série “Falcão e o Soldado Invernal” (2021), infelizmente não atinge o mesmo nível de excelência. Embora a maior parte da equipe de roteiristas da série esteja de volta para o longa, a direção parece não acompanhar a qualidade esperada.
A falta de consistência na condução da trama e na direção dos atores é notável, ainda mais quando comparado ao desenvolvimento mais aprofundado de personagens na série. Outros grandes nomes do elenco, como Giancarlo Esposito e Tim Blake Nelson, que brilham em outras produções, têm papéis limitados, e seus vilões, Seth Voelker e Samuel Sterns, carecem de maior exploração e profundidade.
Apesar desses contratempos, a obra tem seus méritos. Os efeitos especiais são, sem dúvida, um dos destaques, trazendo visuais espetaculares que fazem jus à grandiosidade de uma superprodução. Contudo, quando se trata do universo mais amplo da Marvel, “Capitão América: Admirável Mundo Novo” opta por focar quase exclusivamente na narrativa política. Embora as interações com outros líderes mundiais possam ter potencial para expandir o enredo, o ritmo apressado do roteiro em direção ao clímax e a batalha final deixa a desejar, sobretudo na construção de um sentido de coesão e tensão.
Por fim, o filme entra para o hall de produções afetadas pela “maldição do quarto filme”, aquela sensação de que, após um grande sucesso, a franquia perde o fôlego e não tem mais a mesma força dentro do UCM. “Capitão América: Admirável Mundo Novo” soa como uma tentativa de retornar a um terreno familiar, mas o resultado final é um tanto desarticulado. O longa se esforça para explorar uma trama envolvente, mas o cuidado com a construção do roteiro é insuficiente para manter a qualidade dos títulos anteriores.
Chegou o momento para a Marvel refletir sobre os rumos que seus filmes interconectados devem seguir, explorando narrativas mais coesas e interessantes para o público que tanto aplaudiu essa franquia no passado.
por Artur Francisco – especial para A Toupeira
*Título assistido em cabine de Imprensa promovida pela Walt Disney Studios Br.