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Crítica: “Carcaça”

Um filme minimalista, seja criado com essa intenção ou não, reduz os elementos de trama, personagens, sonoros, para maximizar algum ponto considerado essencial na trama.

“Carcaça” faz isso tudo para se focar no psicológico da protagonista.  Na obra, Lívia (Carol Brasolin) vive fechada em casa com Davi (Paulo Miklos), resultando no crescimento da tensão entre os dois, à medida que um segredo macabro vai se revelando.

São apenas dois personagens em uma casa, com toda obra em preto e branco, girando ao redor da premissa simples dela desconfiando dele durante apenas 70 minutos de suspense e terror. Assim, cada detalhe posto na trama, seja um livro, seja um copo, uma peça de roupa, possui múltiplas camadas de significados.

Um exemplo bem feito é Davi ler continuamente o livro “Náusea”, clássico de Sartre. Em uma camada mais leve, o título indica o sentimento de Lívia sobre Davi que vai crescer cada vez mais.

Em outra, é um clássico literário com pouco alcance popular, reforçando o quando Davi se vê como um rico culto. Em faixas mais profundas, a obra literária é sobre uma mente que passa a se desintegrar conforme adquire nojo de tudo, o que dialoga diretamente com a psique dos personagens.

Lívia começa a ser atormentada por visões que não sabemos serem pesadelos, alucinações ou mesmo memórias distorcidas. A fotografia é usada com eficiência extrema para transmitir esse estado mental, especialmente em closes de ângulos inusitados que reforçam os sentimentos de ameaça, nojo e isolamento.

O longa me recorda o conto clássico gótico “O Papel de Parede Amarelo”. Nesse, a protagonista se muda para uma casa nova, só que a situação de quase aprisionamento em que vive vai distorcendo sua mente de forma cada vez pior. Nunca conseguimos compreender  se há uma força demoníaca atormentando ou é tudo causada pela pressão claustrofóbica do marido controlador. Uma história que influenciou diversas outras ao longo do século 20.

“Carcaça” pode ser visto como um gótico moderno na forma de terror psicológico,  algo próximo às obras de Edgar Alan Poe, onde nunca sabíamos até onde era confiável o relato do narrador. A presença de um segredo oculto sendo pesquisado, uma ameaça sombria, porém, como em Poe, o maior labirinto é a mente humana.

A presença de urubus rondando a casa reforça tanto o clima de historia de terror disfarçado pela claridade, quanto gera várias dúvidas essenciais no espectador: o que há de tão podre que está atraindo eles? Há um corpo escondido?

São uma analogia para o apodrecimento das relações do casal?  A casa está abandonada e estamos vendo lembranças? A produção não dá respostas diretas, mas peças de um quebra cabeças elaborado e com múltiplas faces.

Existe uma frase que gosto muito: “o bom filme começa quando ele acabou, mas continua na sua cabeça”. Esse é o caso de “Carcaça”, um prato cheio para quem gosta de construir teorias em obras com múltiplas interpretações.

por Luiz Cecanecchia – especial para A Toupeira

*Título assistido em Cabine de Imprensa Virtual promovida pela California Filmes.

*Disponível nas plataformas de aluguel: Total Play, Apple, Net Now, Youtube, Vivo, Amazon, Claro Video, Google Play.

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