Areté é uma palavra grega. Aparece de preferência na filosofia e significa “virtude”. É um termo vinculado com a essência de algo, com a mais importante qualidade que aquilo deve ter. Por exemplo, o areté de uma espada é cortar. Por isso, às vezes pode resultar importante o enquadramento que se faz de uma produção cinematográfica por meio dos gêneros. Assim, se é designada como comédia, qual seria seu areté? Divertir, entreter em forma engraçada. Até fazer rir ou sorrir.
Com este título em português, o espectador pode esperar isso: divertir-se. Ainda mais, é apresentada como uma comédia. O problema é que não cumpre nem tem esse objetivo. Isso pode afetar apenas as expectativas prévias, frustrar o público, se este espera assistir a uma hora e meia com aquelas características. Não afetaria o filme em si mesmo. Pode ser até bom, porém não é uma comédia. Não cumpre com seu areté, só se se tomam em conta os antecedentes ou anúncios prévios.
Feita essa ressalva, vamos às impressões que “O Lado Engraçado da Vida” (International Falls) nos deu. Trata-se diretamente de um drama (nem sequer uma comédia dramática). Focado em relações familiares conflitivas, escolha errada da profissão ou trabalho, e reflexões gerais sobre a vida, caminho que os personagens percorreram e sua problemática situação atual. Uma mulher chamada Dee Williamson (Rachael Harris) mora em uma pequena cidade, International Falls, que fica na fronteira dos Estados Unidos com o Canadá. Trabalha na recepção de um hotel, aonde chega o comediante Tim Fletcher (Rob Huebel).
Ambos estão casados e isso vai ter reflexos, pois o matrimônio dela com Gary não está trazendo felicidade. Porém, o vínculo entre o visitante e a recepcionista vai crescendo, em forma não linear, mas progressiva.
Esse encontro derivará, entre outros elementos, em reflexões sobre a criação artística, com prolongadas intervenções que em algum momento podem fazer lembrar a já remota “Capítulo 2”, de 1979. Em diversas passagens ambas têm uma condição excessivamente teatral, porque prevalecem os monólogos sobre as imagens.
Fala-se, então, sobre a verdade ou mentira nas apresentações unipessoais de um comediante; a carreira – às vezes de toda uma vida – para ser tal; sobre a autenticidade que deve ter com relação a si próprio; o diálogo/conversação com os espectadores – que é bem melhor que procurar uma estrutura; buscar uma reação, seja riso ou pranto etc. Em resumo: o ator deve dizer a verdade, sua verdade, seja qual for.
Também se reflete sobre a vida – há uma citação do livro Eclesiastes, do Antigo Testamento bíblico (leitura de trechos interessantes que estão no capítulo 2, ainda que o número não seja dito). Paralelamente, vão aparecendo os conflitos que estão vivendo esse homem e essa mulher. E aí a realização é, decididamente, aquele drama mencionado.
O elenco de atores – principalmente Harris-Huebel – tem um vasto currículo prévio e a tarefa aqui é exigente. Não há grandes destaques técnicos ou artísticos no que se refere à fotografia ou edição, e só uma música (de Eric Shimelonis) que acompanha acertadamente. Dessa maneira, “O Lado Engraçado da Vida” – que estreia na plataforma de streaming Cinema Virtual – vai agradar aqueles que gostem de um filme com as caraterísticas já ditas: drama bastante reflexivo.
por Tomás Allen – especial para A Toupeira
*Título assistido via streaming, a convite da Elite Filmes.
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