Apesar de ser um tema com décadas de exploração por grandes obras, possessões demoníacas e exorcismo aparecem de forma limitada em produções nacionais de destaque, talvez a mais famosa seja “O Exorcismo Negro”, de 1974, dirigida e estrelada pelo saudoso Jose Mojica Marins.
Nela, interpreta a si mesmo como diretor indo repousar e sendo assombrado por um demônio que assumiu a forma de sua obra mais famosa, o Zé do caixão. Escrito por R. F Lucchetti, o longa aproveitou a fama do recém-lançado “O Exorcista”.
Já “Possessões” é de uma nova geração, obra escrita e dirigida por Tiago Santiago, com carreira consolidada das novelas televisivas brasileiras, sendo sua mais famosa a trilogia “Os Mutantes – Caminhos do Coração”, de onde vieram parte dos atores do filme, mostrando sua preferência em trabalhar com o fantástico.
O longa é composto por um curta e um média metragem. O primeiro mostra um rapaz pedindo sua namorada em casamento, mas sendo ela possuída pelo espírito vingativo de um antigo caso. Já o segundo, de duração bem maior, nos traz uma jovem cujo único apartamento que é capaz de pagar possui o segredo macabro.
A primeira história (“Obsessão) é simples, com o destaque ficando para as cerimônias de exorcismo afro-brasileiras, que dão uma estética única e bem caprichada para a obra, tendo sido feita em consultoria com religiosos do candomblé e da umbanda para evitar desrespeito.
Na segunda história (“O Portal”) temos um roteiro bem mais elaborado, explorando os segredos por trás do prédio, criando uma mitologia própria sobre os moradores antigos, os donos e a origem da força maligna que lá habilita, com direito a uma emocionante batalha final pela alma da protagonista.
A fotografia e a trilha sonora combinam para dar o clima adequado a cada cena de maneira caprichada, tanto que o clipe sombrio de abertura é a parte mais bonita do filme.
Sobre o desenvolvimento dos personagens existe um problema importante. Os conceitos são interessantes: O casal do início mostra um homem manipulador que não assume seus pecados e escolhe justamente alguém manipulável como esposa. A protagonista da segunda história fica em um limite cinzento bem trabalhado entre teimosia e empoderamento de uma jovem esotérica, além de ótimos coadjuvantes como o porteiro apavorado ou o vizinho quase louco pelos acontecimentos sombrios.
Contudo, por mais que fique explícita a atuação dedicada dos atores, o conteúdo dos diálogos e a forma como são editados não atingem o esperado. Frases muito repetitivas e a câmera quase esfregando no rosto dos atores com oscilações estranhas de foco ao longo das conversas. Tanto que, com poucas modificações de roteiro, daria para ser uma comédia de terror.
Assim, “Possessões” é uma obra mediana que diverte e gera um acréscimo real para o cinema nacional trabalhando novas abordagens. Fãs de filmes de casas assombradas ou de um de terror mais trash, como eu, vão saborear bem a obra. Adoraria se resultasse em uma série de TV onde cada episódio mostra-se uma situação sobrenatural diferente em distintos apartamentos do prédio da segunda história.
por Luiz Cecanecchia – especial para A Toupeira
*Título assistido em Cabine de Imprensa promovida pela Europa Filmes / Vinny Filmes.